História da Física



Desde os primórdios da humanidade, o homem tenta compreender a natureza, o seu destino e a utilidade de tudo o que nela existe.
Os gregos foram os primeiros a criarem uma teoria concreta sobre este assunto que tanto interessava os grandes pensadores da época. Atualmente, a física, ou filosofia natural como era chamada, é de interesse de todos e está presente em praticamente tudo o que nos cerca.
A Física na linha do tempo
Os primeiros estudos dos fenômenos naturais são datados de centenas de anos antes de Cristo. Desde a Grécia Antiga o homem procura entender o funcionamento da natureza e busca na ciência estas explicações. Atualmente, a física atua em vários ramos da indústria, de tecnologia, de geração de energia entre outros.
Segue abaixo um histórico de alguns dos tópicos mais importantes da evolução da física desde Leucipo à detecção dos quarks:
  • Séc. V a.C. - O filósofo grego Leucipo desenvolve a teoria de que a matéria de todos os corpos é formada por partículas infinitamente pequenas chamadas de átomos.
  • Séc. III a.C. – Aristóteles elaborou um sistema filosófico para a explicação do movimento dos corpos e do mundo físico que o cercava. Para Aristóteles, toda e qualquer matéria era composta de quatro elementos: Terra, Água, Ar e Fogo, e esses elementos tinham posições determinadas no Universo. O lugar natural do fogo e do ar era sempre acima do lugar natural da água e da terra. Desse modo explicava porque uma pedra e a chuva caem: seus lugares naturais eram terra e água. Analogamente, a fumaça e o vapor sobem em busca de seus lugares naturais acima da terra. Aristóteles também elaborou várias outras teorias sobre ciências naturais que foram aceitas até a renascença.
  • Séc. III a.C - o pensador grego Arquimedes deduziu muitas descrições corretas da hidrostática quando, como a história conta, ele notou que seu próprio corpo deslocava um volume de água enquanto ele estava tomando um banho um dia.
  • 1025 - O árabe Alhazen (965-1039), estuda fenômenos óticos e propõe que os olhos humanos funcionem como lentes captadoras de luz. Afirma que as pessoas só vêem porque são capazes de detectar a luz que é refletida por outros objetos. Escreveu numerosas obras notáveis pelo estilo e pelas observações sobre os fenômenos da refração da luz, com especial incidência na refração atmosférica ao nascer e ao pôr do Sol.
  • 1269 - Datado de 8 de agosto de 1269, Pierre Pèlerin de Maricourt escreveu um trabalho conhecido como Epístola do Magneto, com a qual explica como identificar os pólos de uma bússola. Também descreve as leis da atração e repulsa magnética, bem como a descrição de bússolas, uma dos quais poderia direcionar seus passos para cidades e ilhas e qualquer lugar do mundo.
  • 1510 – Pela primeira vez de que se têm registros, a teoria Heliocêntrica de Nicolau Copérnico é apresentada em sua obra Commentariolus.
  • 1543 – Nicolau Copérnico publica uma obra que trata sobre as revoluções dos corpos celestes em torno do Sol.
  • 1589 – Galileu Galilei inicia o estudo do movimento do pêndulo tendo determinado que o seu período não depende da massa, mas apenas do comprimento do fio. Foi o primeiro a pensar que este fenômeno permitiria fazer relógios muito mais precisos, e chegou já no final da sua vida a trabalhar no mecanismo de escapo que mais tarde originaria o relógio de pêndulo. Também em Pisa realizou as suas famosas experiências de queda de corpos em planos inclinados. Nestas demonstra que a velocidade de queda não depende do peso.
  • 1647 – Blaise Pascal enuncia os primeiros trabalhos sobre o vácuo e demonstrou as variações da pressão atmosférica.
  • 1648 – O italiano Evangelista Torricelli, inventa um barômetro de mercúrio, que mais tarde levaria seu nome.
  • 1657 - Robert Hooke comprova a teoria de Galileu de que todos os corpos caem com a mesma velocidade no vácuo.
  • 1662 - Robert Boyle demonstra que o ar pode ser comprimido, formulando a lei que relaciona volume e pressão de um gás, que passaria a se chamar Lei de Boyle.
  • 1665 - Isaac Newton faz as primeiras hipóteses sobre gravitação, segundo crenças, após ser atingido por uma maçã.
  • 1666 - Isaac Newton descobre o espectro da luz branca, chegando à conclusão de que a luz branca é na verdade a composição de todas as cores do espectro que são as cores do arco-íris.
  • 1676 - Olaus Römer propõe que a luz tem uma velocidade finita.
  • 1678 - Christiaan Huygens defende a idéia de que a luz se propaga como onda. Mas não consegue demonstrar, na prática, o que afirma. Também descobre a polarização da luz. 
  • 1687 - Isaac Newton publica o livro Principia, no qual apresenta as três leis que regem a física clássica e a lei da gravitação universal. 
  • 1690 - Christiaan Huygens formula a teoria ondulatória da luz.
  • 1738 - Daniel Bernoulli levanta a hipótese de que os gases são compostos de uma infinidade de partículas minúsculas, sempre em movimento. E que a temperatura de um gás reflete a velocidade dessas partículas. Também publica estudos sobre a pressão e a velocidade dos fluidos.
  • 1752 - Benjamim Franklin publica o resultado de suas observações sobre raios, propondo que existem dois tipos de carga elétrica, a positiva e a negativa. Propõe também a lei da atração e repulsa das cargas de acordo com seu sinal.
  • 1785 - Charles Augustin Coulomb enuncia a lei das forças eletrostáticas.
  • 1800 - William Herschel descobre que o Sol emite, além de luz, outro tipo de raio: os raios infravermelhos.
  • 1801 - Thomas Young demonstra que a luz é, ou pode se comportar como uma onda.
  • 1801 - Carl Ritter descobre a radiação ultravioleta. 
  • 1820 - Hans Oersted aproxima uma bússola de um fio eletrificado, mostrando que a corrente elétrica podia mover o ponteiro da bússola dando uma demonstração prática de que as forças elétricas e magnéticas têm propriedades comuns.
  • 1820 - André-Marie Ampère formula leis da eletrodinâmica.
  • 1821 - Michael Faraday propõe os fundamentos da indução eletromagnética.
  • 1824 - Nicolas-Leonard-Sadi Carnot dá início à termodinâmica em uma tentativa de avaliar e aumentar a eficiência das máquinas a vapor.
  • 1827 - Georg Simon Ohm formula a lei que relaciona o potencial, a resistência e a corrente elétrica.
  • 1831 – Michael  Faraday propõe a indução eletromagnética.
  • 1831 - James Maxwell descreve a luz como uma onda eletromagnética.
  • 1839 - Antoine Becquerel descobre um dispositivo capaz de captar energia da luz, a célula fotovoltaica.
  • 1842 - Christian Doppler formula as bases do efeito Doppler.
  • 1843 - James Prescott Joule constrói uma máquina capaz de medir a equivalência mecânica do calor, determinando assim a quantidade de trabalho mecânico necessária para produzir uma unidade de calor.
  • 1847 – A experiência de Joule torna possível a afirmação da chamada Lei de Conservação da Energia, ou Primeira Lei da Termodinâmica. Definida por Hermann Ludwig Ferdinand von Helmholtz.
  • 1848 - William Thomson, o Lorde Kelvin, verifica que a temperatura dos corpos não pode diminuir indefinidamente. Chegando a um limite a partir do qual ela não cai mais, denominado zero absoluto. 
  • 1849 - Armand Fizeau mede a velocidade da luz. 
  • 1850 – Rudolf Julius Emanuel Clausius cria a Segunda Lei da Termodinêmica.
  • 1859 – Gustav Robert Kirchhoff descobre as linhas espectrais, diferentes para cada elemento químico.
  • 1865 – James Clerk Maxwell unifica as leis das forças elétricas e magnéticas. Descobre também que a luz é apenas energia eletromagnética em movimento. Ou seja, Maxwell unifica três ciências: a eletricidade, o magnetismo e a ótica. 
  • 1884 - A mecânica estatística, desenvolvida pelo alemão Ludwig Eduard Boltzmann, aprofunda a Teoria Cinética dos Gases, de Maxwell.
  • 1887 - Heirich Rudolf Hertz descobre o efeito fotoelétrico.
  • 1895 - Wilheim Konrad Röntgen revela a existência dos raios X.
  • 1896 - Henri Becquerel descobre a radiatividade.
  • 1896 - Rutherford descobre os raios alfa e beta produzidos nos átomos radiativos.
  • 1900 - Max Planck propõe a existência de minúsculos "pacotes" de luz e chama esses pacotes de quanta.
  • 1905 - Albert Einstein declara que os quanta são uma nova espécie de partículas: os átomos de luz.
  • 1905 – Albert Einstein desenvolve a Teoria da Relatividade.
  • 1907 - Hermann Minkowski desenvolve uma formulação matemática mais elegante e mais prática para a Teoria da Relatividade, adicionando uma quarta dimensão ao espaço, a dimensão do tempo.
  • 1908 - Jean-Baptiste Perrin observa pela primeira vez o tamanho dos átomos.
  • 1911 - Ernest Rutherford verifica que o átomo tem um núcleo central, duríssimo, no qual fica concentrada quase toda sua massa.
  • 1913 - Niels Bohr dá a primeira descrição de um átomo. No centro ficaria o núcleo, cerca de 100 mil vezes menor que o átomo todo. A sua volta girariam os elétrons da mesma forma como os planetas orbitam o Sol.
  • 1916 - Albert Einstein propõe a Teoria da Relatividade Geral que amplia sua Teoria da Relatividade, que então passa a ser conhecida como Teoria da Relatividade Restrita, para englobar os efeitos da força da gravidade.
  • 1923 - Louis-Victor-Pierre-Raymond de Broglie demonstra que as partículas podem agir como ondas. Ele descobre que o elétron aparece como uma partícula, ou seja, um concentrado de matéria, e, também, como onda, como se sua massa estivesse espalhada pelo espaço, oscilando.
  • 1926 - Partindo da idéia de que as partículas, como o elétron, às vezes agem como ondas, Erwin Schrödinger reformula imagem dos átomos. Os elétrons, agora, não seriam mais partículas girando em torno do núcleo e sim como se cada elétron fosse uma onda vibrando ao redor do núcleo.
  • 1927 - Werner Carl Heisenberg define o Princípio da Incerteza, sobre o qual se baseia quase toda a mecânica quântica.
  • 1932 - James Chadwick detecta o nêutron, a segunda partícula componente do núcleo dos átomos.
  • 1932 - Carl David Anderson observa o pósitron, que é a antimatéria do elétron, ou seja, uma partícula igual ao elétron em todos os aspectos, exceto na carga elétrica, que é positiva no pósitron e negativa no elétron.
  • 1934 - Enrico Fermi descobre a força que mais tarde seria chamada de nuclear fraca.
  • 1935 - Hideki Yukawa descobre a força nuclear forte.
  • 1939 - Pela primeira vez um núcleo atômico é fissionado, o do Urânio.
  • 1947 – São detectados outros dois tipos de partículas subatômicas, os mésons e os hípedrons.
  • 1956 – Mais uma partícula subatômica é detectada, o neutrino, pelo Laboratório de Los Angeles.
  • 1967 – John Wheeler propõe o termo “buraco negro”.
  • 1972 - Murray Gell-mann propõe a teoria de que os componentes do núcleo atômico são compostos de partículas ainda menores, os quarks.
  • 1986 - Bednorz e K.A. Müller produzem um supercondutor a "alta" temperatura, ou seja, um material que sob temperaturas baixas, mas alcançáveis, apresenta resistividade elétrica nula.
  • 1987 - Johannes Georg Bednorz e Karl Alex Müller descobrem as chamadas cerâmicas supercondutoras, capazes de conduzir eletricidade sem perda de energia.

    Durante um longo tempo, acreditava-se que as leis que regiam a natureza estavam associadas apenas à Terra e suas proximidades, e que nada que não pudesse ser visto a olho nú poderia estar sendo regido pela lei da mecânica macroscópica, por exemplo.
    Hoje em dia, tal pensamento está desmistificado, embora muitas das leis da chamada física clássica não sejam válidas para as particularidades da física moderna.
    Alguns dos muitos passos dados em direção ao conhecimento da natureza e destas particularidades estão fundamentados nas grandes descobertas de ínumeros estudiosos. Acompanhe algumas delas:

    A Descoberta da Radioatividade
    Introdução
    Quase todos já ouviram falar sobre a descoberta da radioatividade, que é um fenômeno pelo qual os núcleos atômicos sofrem transformações e emitem radiações, podendo, nesse processo, formar novos elementos químicos. Costuma-se dizer que esse fenômeno foi descoberto, acidentalmente, por Henri Becquerel, em 1896. Tudo aconteceu porque Becquerel guardou, em uma gaveta, um composto de urânio juntamente com uma chapa fotográfica, havendo depois revelado a chapa e notado nela os sinais da radiação.
    A história não é bem assim. Dificilmente se poderia afirmar que Becquerel descobriu a radioatividade; e aquilo que ele de fato descobriu não foi fruto do acaso.
    Este capítulo mostrará qual foi o trabalho de Becquerel, o longo e tortuoso caminho que levou à descoberta da radioatividade e discutirá as dificuldades de compreensão dos fatos que eram observados. Esse episódio é muito instrutivo, por mostrar claramente como as expectativas teóricas podem influenciar as próprias observações, levando o pesquisador a ver coisas que não existem.

    A radiação dos corpos luminescentes
    A descoberta dos raios X suscitou quase instantaneamente um grande número de trabalhos na Academia de Ciências de Paris, e foi a principal motivação para o trabalho inicial de Becquerel. Nesse sentido, destaca-se, em particular, a hipótese levantada por Poincaré, de que havia uma relação entre a emissão dos raios X e a fluorescência do vidro de que era feito o tubo de raios X. Nas suas próprias palavras:
    "É, portanto, o vidro que emite os raios Roentgen, e ele os emite tornando-se fluorescente. Podemos nos perguntar se todos os corpos cuja fluorescência seja suficientemente intensa não emitiriam, além de raios luminosos, os raios X de Roentgen, qualquer que seja a causa de sua fluorescência. Os fenômenos não seriam então associados a uma causa elétrica. Isso não é muito provável, mas é possível e, sem dúvida, fácil de verificar".
    É a busca dessa relação entre fluorescência e raios X que irá levar aos estudos de Becquerel. Na verdade, de acordo com os nossos conhecimentos atuais, não existe relação direta entre a emissão de raios X e a luminescência. Mas é graças a essa pista falsa que muitas descobertas serão feitas.
    Vários trabalhos relacionados com a descoberta de Roentgen foram apresentados na Academia nas primeiras sessões de 1896. Na sessão de 03/02/1896, Nodon informa que um arco voltaico não produz raios X, mas Moreau comunica que eles são emitidos pela descarga de alta voltagem de uma bobina de indução, sem a utilização de um tubo de vácuo e, portanto, sem raios catódicos. Benoist e Hurmuzescu observam que os raios X são capazes de descarregar um eletroscópio. Na outra semana (10/02/1896) aparece o primeiro trabalho destinado a testar a sugestão de Poincaré.
    Nessa sessão, Poincaré apresenta à Academia um trabalho de Charles Henry. Ele testa inicialmente se o sulfeto de zinco fosforescente é capaz de aumentar o efeito dos raios X e conclui que sim: se um objeto metálico é parcialmente recoberto com uma camada de sulfeto de zinco, a radiografia desse objeto fica mais forte e nítida na região recoberta do que na região sem sulfeto de zinco. Ainda mais: utilizando a luz produzida pela queima de uma fita de magnésio, em laboratório, Henry afirma ter conseguido obter efeitos iguais aos de uma radiografia, bastando recobrir o objeto com uma camada de sulfeto de zinco. A hipótese de Poincaré parecia estar confirmada.
    Na semana seguinte (17/02/1896), entre a já usual profusão de estudos sobre os raios X, surge um trabalho de Niewenglowski que confirma e amplia os resultados de Henry. Ele utiliza outro material fosforescente - o sulfeto de cálcio. Eis sua descrição:
    "Tendo envolvido uma folha de papel sensível ordinário (papel fotográfico) com diversas camadas de papel agulha negro ou vermelho, coloquei acima dela duas moedas e recobri uma das metades (da folha) com uma placa de vidro com pó fosforescente (sulfeto de cálcio). Depois de quatro ou cinco horas de exposição ao Sol, a metade do papel sensível que havia recebido diretamente as radiações solares havia permanecido intacta e não apresentava nenhum sinal da moeda colocada acima dela, indicando assim que o papel negro ou vermelho não havia sido atravessado pela luz. A metade que só recebia os raios solares através da placa fosforescente estava completamente enegrecida, exceto pela porção correspondente a uma das moedas, da qual foi produzida uma silhueta branca sobre (um fundo) negro.
    Colocando apenas uma camada de papel vermelho fino, permitindo a passagem dos raios solares, constatei que a porção do papel sensível que só recebia as radiações solares após sua passagem pela camada fosforescente enegrecia muito mais rapidamente do que a outra".
    As observações de Niewenglowski corroboravam as de Charles Henry: os materiais fosforescentes pareciam emitir raios X, quando iluminados. Ainda mais: Niewenglowski estuda o efeito da fosforescência do sulfeto de cálcio colocado em um local escuro, depois de ter recebido a luz do Sol, concluindo que também nesse caso o material continuava a emitir radiações capazes de atravessar o papel negro:
    "Pude também observar que a luz emitida pelo pó fosforescente, previamente iluminado pelo Sol, na obscuridade, era capaz de atravessar várias camadas de papel vermelho e obscurecer um papel sensível que dele estava separado por essas camadas de papel".
    Passa-se mais uma semana. Na sessão de 24/02/1896, Piltchikof anuncia que, utilizando uma substância fortememente fluorescente dentro do tubo de Crookes, no local onde os raios catódicos atingem a parede de vidro, observou um grande aumento da intensidade dos raios X, permitindo a realização de radiografias em 30 segundos (anteriormente, eram necessários vários minutos). A sugestão de Poincaré já estava, portanto, resultando em importantes aplicações técnicas. Todos esses resultados espantarão a qualquer físico moderno. Não se conhece, atualmente, nenhum efeito semelhante a esse descrito por tais autores. As experiências não deveriam ter proporcionado os resultados observados. O que aconteceu? Não se sabe.
    Nessa mesma sessão da Academia, aparece o primeiro trabalho de Henri Becquerel sobre o assunto.
    A contribuição de Henri Becquerel
    Henri Becquerel pertencia a uma ilustre família de cientistas. Seu avô, Antoine Becquerel, nascido em 1788, foi um importante investigador dos fenômenos elétricos e magnéticos, tendo publicado um grande tratado sobre o assunto. O pai de Henri, Edmond Becquerel (1821-1891), notabilizou-se por seus estudos a respeito das radiações ultravioleta e dos fenômenos de fosforescência e fluorescência. Especialmente de 1859 a 1861, estudara os sulfetos de cálcio, de bário, de estrôncio e outros. Entre os materiais que estudou estavam incluídos alguns sais de urânio.
    No laboratório de seu pai, Henri Becquerel desenvolveu seu treino cientifico e realizou suas primeiras pesquisas - quase todas sobre óptica e muitas delas, no período de 1882 a 1897, sobre fosforescência. Entre outras coisas, estudou a fosforescência invisível (no infravermelho) de várias substâncias. Estudou, em particular, os espectros de fluorescência de sais de urânio, utilizando amostras que seu pai havia acumulado ao longo dos anos.
    Nada era mais natural do que o interesse de Henri Becquerel pelos raios X e, mais particularmente, pela conjectura de Poincaré e pelos trabalhos de Henry e Niewenglowski. De fato: parecia simplesmente que, além de poderem emitir radiação visível e infravermelha, os corpos luminescentes podiam também emitir raios X. Becquerel resolve fazer experimentos sobre o assunto. Reproduziremos, abaixo, o texto completo da primeira nota de Henri sobre o assunto, apresentada à Academia no dia 24/02/1896 (dois meses após a divulgação da descoberta dos raios X):
    "Em uma reunião precedente [da Academia de Ciências Francesa], Charles Henry notificou que, ao se colocar sulfeto de zinco fosforescente no caminho dos raios que saem de um tubo de Crookes, aumentava a intensidade das radiações que penetram o alumínio.
    Além disso, Niewenglowski descobriu que o sulfeto de cálcio fosforescente, comercial, emite radiações que penetram em substâncias opacas.
    Esse comportamento se estende a várias substâncias fosforescentes e, em particular, aos sais de urânio, cuja fosforescência tem uma duração muito curta.
    Com o sulfato duplo de urânio e potássio, de que possuo alguns cristais sob a forma de uma crosta transparente, fina, realizei a seguinte experiência:
    Envolve-se uma chapa fotográfica de Lumiére em duas folhas de papel negro muito espesso, de tal forma que a chapa não se escureça mesmo exposta ao Sol durante um dia. Coloca-se uma placa da substância fosforescente sobre o papel, do lado de fora, e o conjunto é exposto ao Sol durante várias horas. Quando se revela a chapa fotográfica, surge a silhueta da substância fosforescente, que aparece negra no negativo. Se for colocada uma moeda ou uma chapa metálica perfurada, entre a substância fosforescente e o papel, a imagem desses objetos poderá ser vista no negativo.
    As mesmas experiências podem ser repetidas colocando-se uma chapa fina de vidro entre a substância fosforescente e o papel; e isso exclui a possibilidade de qualquer ação química por vapores que pudessem sair da substância ao ser aquecida pelos raios do Sol. Pode-se concluir dessas experiências que a substância fosforescente em questão emite radiações que penetram um papel opaco à luz e reduzem sais de prata [sensibilizam o papel fotográfico]".
    Note-se que Becquerel conhece os trabalhos anteriores de Henry e Niewenglowski e que reproduz, sem grande alteração, o experimento do segundo. Apenas testou uma nova substância - o sulfato duplo de uranila e potássio - confirmando, também nesse caso, a hipótese de Poincaré.
    Na semana seguinte (02/03/1896), d’Arsonval descreve ter obtido radiografias utilizando uma lâmpada fluorescente e recobrindo os objetos a serem radiografados com um vidro fluorescente contendo um sal de urânio. Conclui nesse artigo que todos os corpos que emitem radiações fluorescentes amarelo-esverdeadas são capazes de impressionar chapas fotográficas recobertas por papel opaco à luz.
    É nessa mesma sessão da Academia que Becquerel apresenta uma segunda nota, que é comumente descrita como representando a descoberta da radioatividade. Cortés Pla é um dos que comete esse erro, apesar de haver lido (e traduzido) os artigos de Becquerel: "Uma semana depois, no dia 2 de março, a Academia escuta o resultado de novas investigações que imortalizariam o nome de Becquerel, já que nelas se descreve a existência de um novo fenômeno: a radioatividade..." [ref. 6, p. 32].
    Nessa segunda nota, Becquerel prossegue o estudo dos efeitos produzidos pelo sulfato duplo de uranila e potássio. Varia o experimento anterior, observando que as radiações emitidas por esse material são menos penetrantes do que os raios X comuns. Nota também que a emissão da radiação penetrante ocorre tanto no caso em que o material fosforescente é iluminado diretamente pelo Sol quanto ao ser iluminado por luz refletida ou refratada. Observa também que, mesmo no escuro, o material estudado sensibiliza chapas fotográficas (como o sulfeto de cálcio de Niewenglowski). Eis a transcrição dessa parte do artigo:
    "Insistirei particularmente sobre o seguinte fato, que me parece muito importante e alheio ao domínio dos fenômenos que se poderia esperar observar. As mesmas lamelas cristalinas, colocadas junto a chapas fotográficas, nas mesmas condições, isoladas pelos mesmos anteparos, mas sem receber excitação por incidência de radiação e mantidas na obscuridade, ainda produzem as mesmas impressões fotográficas. Eis de que maneira fui levado a fazer essa observação: dentre as experiências precedentes, algumas foram preparadas na quarta-feira, 26, e na quinta-feira, 27 de fevereiro; e como, nesses dias, o Sol apareceu apenas de modo intermitente, conservei as experiências que havia preparado e coloquei as placas com seus envoltórios na obscuridade de uma gaveta de um móvel, deixando as lâminas do sal de urânio em seu lugar. Como o Sol não apareceu de novo nos dias seguintes, revelei as placas fotográficas a 1o de março, esperando encontrar imagens muito fracas. Ao contrário, as silhuetas apareceram com grande intensidade. Pensei logo que a ação devia ter continuado na obscuridade e preparei a experiência seguinte:
    No fundo de uma caixa de cartão opaco coloquei uma placa fotográfica; depois, sobre o lado sensível, coloquei uma lamela de sal de urânio, lamela convexa [com a parte central mais alta] e que tocava a gelatina apenas em poucos pontos; então, ao lado, na mesma placa, coloquei outra lâmina do mesmo sal, separada da gelatina por uma fina lâmina de vidro. Após realizar essa operação, na sala escura, a caixa foi fechada, então colocada dentro de outra caixa de papelão e por fim dentro de uma gaveta.
    Repeti o processo com um receptáculo fechado por uma folha de alumínio, em que coloquei uma chapa fotográfica, e, do lado de fora, uma lamela do sal de urânio. O conjunto foi fechado em uma caixa de papelão opaco e depois em uma gaveta. Após cinco horas, revelei as placas e as silhuetas das lâminas cristalinas apareceram em negro, como nas experiências precedentes, como se tivessem se tornado fosforescentes pela luz. Em relação à lamela colocada diretamente sobre a gelatina, praticamente não havia diferença entre os efeitos nos pontos de contato e das partes da lamela que estavam separadas da gelatina por cerca de um milímetro; a diferença pode ser atribuída às diferentes distâncias das fontes das radiações ativas. A ação da lamela colocada sobre o vidro estava um pouco enfraquecida, mas a forma da lamela foi muito bem reproduzida. Finalmente, através da folha de alumínio, a ação foi consideravelmente enfraquecida, mas apesar disso, era muito nítida.
    É importante notar que este fenômeno não parece dever ser atribuído a radiações luminosas emitidas por fosforescência, já que após 1/100 de segundo estas radiações se tornam tão fracas que são quase imperceptíveis.
    Uma hipótese que surge muito naturalmente ao espírito seria a suposição de que essas radiações, cujos efeitos possuem uma forte analogia com os efeitos produzidos pelas radiações estudadas por Lenard e Roentgen, poderiam ser radiações invisíveis emitidas por fosforescência, cuja duração de persistência fosse infinitamente maior do que a das radiações luminosas emitidas por essas substâncias. No entanto, as experiências presentes, sem serem contrárias a essa hipótese, não permitem formulá-la. As experiências que estou desenvolvendo agora poderão, espero, contribuir com algum esclarecimento sobre esse novo tipo de fenômeno".
    Note-se que não há quase nada de novo nesse "novo tipo de fenômeno". A única novidade é que a fosforescência invisível parecia durar muito mais do que a fosforescência visível (o que não era, de modo algum, contrário ao que se conhecia).
    Em outro artigo de revisão sobre os raios X, publicado nesse mesmo mês, Raveau descreve os estudos de Charles Henry, Niewenglowski, Piltchikof, d’Arsonval e Becquerel como sendo, todos eles, casos especiais do fenômeno previsto por Poincaré e descoberto por Charles Henry.
    Na semana seguinte (09/03/1896), em meio à quota usual de artigos sobre raios X, Battelli e Gambasso estudam o papel de substâncias fluorescentes no aumento do efeito dos raios de Roentgen. Troost estuda o sulfeto de zinco fosforescente (blenda) e repete e confirma as observações de Charles Henry, obtendo fortes imagens radiográficas ao excitar a fosforescência por meio da luz do magnésio. Troost cita também os trabalhos de Niewenglowski e Becquerel. Por sua vez, Henri Becquerel apresenta uma terceira comunicação. Nela, afirma que a radiação emitida pelo sal de urânio estudado é capaz de descarregar um eletroscópio (como os raios X). Era natural tentar repetir com essa radiação todos os tipos de experimentos já realizados com a radiação de Roentgen, para testar se eram iguais ou não. No entanto, a principal analogia que parecia atuar na mente de Becquerel era outra: o fenômeno era muito semelhante à fosforescência invisível (que ele havia estudado) na qual havia emissão de radiação infravermelha. Ora, a radiação infravermelha é da mesma natureza da luz e, ao contrário do que havia sido descrito no caso dos raios X, ela se reflete e refrata. Becquerel estuda a radiação do sulfato de uranila e potássio e conclui que ela se reflete em superfícies metálicas e se refrata no vidro comum. Sabe-se, atualmente, que essa radiação não se reflete, nem se refrata no vidro.
    No mesmo artigo, Becquerel descreve observações nas quais os sais de urânio continuam a sensibilizar chapas fotográficas mesmo quando o material fosforescente fica guardado na obscuridade durante 7 dias e observa: "Talvez esse fato possa ser comparado à conservação indefinida, em certos corpos, da energia que absorveram e que é emitida quando são aquecidos, fato sobre o qual já chamei atenção em um trabalho [de 1891] sobre a fosforescência pelo calor". Nota-se que Becquerel continua a se basear nos fenômenos que já conhece, não reconhecendo nada de fundamentalmente novo naquilo que estuda.
    No mesmo artigo, Becquerel estuda outros materiais fosforescentes. Alguns deles são sais de urânio. Com todos eles são observados os mesmos efeitos. Com o sulfeto de zinco, ao contrário do que Henry e Troost haviam observado, Becquerel não nota nenhum efeito. No entanto, Becquerel faz observações na obscuridade - e Henry e Troost haviam feito experimentos enquanto o sulfeto de zinco era iluminado. Outros materiais fosforescentes (sulfeto de estrôncio e de cálcio) são examinados. O primeiro não proporciona nenhum efeito, no escuro. Uma amostra de sulfeto de cálcio que produzia fosforescência alaranjada também não produz efeitos, mas dois sulfetos de cálcio com luminescências azul e azul-esverdeado "produziam efeitos muito fortes, os mais intensos que já obtive nessas experiências. O fato relativo ao sulfeto de cálcio azul está de acordo com a observação do Sr. Niewenglowski através do papel negro."
    Por nossos conhecimentos atuais, é muito difícil compreender como podem ter ocorrido os efeitos descritos por Becquerel. As radiações emitidas pelos sais de urânio, na verdade, não se refletem nem se refratam; e o sulfeto de cálcio não deveria emitir radiações semelhantes às dos sais de urânio (e, pior ainda, mais fortes!). Ou existiram efeitos que não podem ser explicados por nossos conhecimentos, ou Becquerel se enganou em suas observações - e, neste caso, pode ter sido induzido por suas expectativas teóricas a ver fenômenos inexistentes. A menos que essas experiências sejam repetidas, com os mesmos materiais por ele utilizados, não será possível, no entanto, excluir a existência de fenômenos físicos atualmente ignorados e diferentes da radioatividade.
    Passam-se duas semanas e Becquerel publica novo trabalho (23/03/1896). Nele, descreve observações de que alguns compostos de urânio que não são luminescentes também produzem os efeitos antes descritos. Assim sendo, essa fosforescência invisível parece não ter ligação com a fosforescência ou fluorescência visível. Mas parece, segundo Becquerel, tratar-se realmente de um caso de fosforescência, pois ele afirma que a radiação aumenta quando os cristais que estavam no escuro são expostos à luz solar ou quando são iluminados por uma descarga elétrica - novamente, o fenômeno descrito não deveria ocorrer, pelo que sabemos. Há outra observação curiosa, neste artigo. Becquerel afirma que as amostras de sulfeto de cálcio, que haviam produzido efeitos no escuro, agora não impressionavam mais as chapas fotográficas.
    Como já se viu, Becquerel acreditava que a radiação que estudava era semelhante à luz, pois se refletia e refratava, ao contrário dos raios X. No seu artigo seguinte, descreve experiências com finas lâminas de turmalina e afirma haver notado efeitos de polarização de sua radiação (outro resultado estranho!). Continua também a afirmar que o efeito se torna mais forte quando o material é excitado pela luz (e repete isso também no trabalho seguinte).
    Passam-se agora 7 semanas. Só então Becquerel apresenta nova comunicação. Depois de ter observado que todos os compostos de urânio (luminescentes ou não) emitiam essas mesmas radiações invisíveis, Becquerel resolve testar o urânio metálico. Obtém uma amostra preparada por Moissan (químico que nesse mesmo ano havia isolado o metal) e verifica que ele também emite a radiação. Ora, isso poderia ter mostrado que não se tratava de um fenômeno de fosforescência e sim algo de outra natureza. Mas Becquerel conclui que esse é o primeiro caso de um metal que apresenta uma fosforescência invisível. Seria natural, a partir daí, pesquisar a existência de outros elementos que emitissem radiações semelhantes, mas Becquerel não o faz. Após esse trabalho, de 18 de maio, ele parece se desinteressar e abandona esse estudo.

    Os dois primeiros anos
    Como se pode perceber pela descrição feita até aqui, os trabalhos de Becquerel não estabeleceram nem a natureza das radiações emitidas pelo urânio nem a natureza subatômica do processo. Seu trabalho, originado, como o de Charles Henry e outros, pela hipótese de Poincaré, era apenas um dos muitos, da época, que apresentavam resultados de difícil interpretação. Visto no contexto da época, eram pesquisas que não tiveram o impacto nem a fecundidade da descoberta dos raios X.
    Poucos pesquisadores se dedicaram ao estudo dos "raios de Becquerel" ou "raios do urânio" até início de 1898. Por um lado, os próprios compostos luminescentes do urânio (ou o urânio metálico) eram de difícil obtenção. Por outro lado, Becquerel parecia ter esgotado o assunto. Além disso, muitos outros fenômenos anunciados na mesma época desviavam a atenção e apontavam igualmente para aspectos delicados desse tipo de estudos.
    No Japão, em 1896, Muraoka investigou se certos vermes luminescentes eram capazes de emitir radiações invisíveis penetrantes, capazes de sensibilizar placas fotográficas. Parecia que sim, mas os resultados eram estranhos: o efeito só surgia quando os vermes eram mantidos úmidos e quando havia um cartão entre eles e a placa fotográfica. Concluiu-se, depois, que o efeito era devido apenas à umidade (pois papel umedecido produzia o mesmo resultado). No mesmo ano, observou-se que algumas placas metálicas recentemente polidas (de zinco, magnésio e cádmio) também sensibilizavam chapas fotográficas. Um pesquisador norte-americano, McKissic, divulgou no mesmo ano que muitas outras substâncias pareciam emitir raios de Becquerel: cloreto de lítio, sulfeto de bário, sulfato de cálcio, cloreto de quinina, açúcar, giz, glicose e acetato de urânio. Várias outras alegações semelhantes surgiram no mesmo período - quase todas sem fundamento. Tudo isso ajudava a confundir a situação.
    Em um artigo de revisão do assunto publicado em 1898, Stewart descreveu todos os tipos de trabalhos publicados na época. Chegou à conclusão (provavelmente a mais aceita, na época) de que os raios de Becquerel eram ondas eletromagnéticas transversais (como a luz) de pequeno comprimento de onda e que o processo de emissão era um tipo de fosforescência. Repete os resultados de Becquerel relativos à reflexão, refração e polarização dos raios de urânio e o aumento de intensidade da radiação após exposição à luz. Adota, essencialmente, a mesma concepção que Becquerel. É verdade que, em 1897, Gustave le Bon havia repetido os experimentos de Becquerel e não havia notado nenhum sinal de reflexão, refração ou polarização, mas ninguém lhe deu atenção. Todos imaginaram que se tratava de um tipo de radiação ultravioleta.
    Pode-se dizer que, de maio de 1896 ao início de 1898, esse campo de estudos ficou estagnado. O único resultado novo, durante esse tempo, foi o de que a radiação do urânio permanecia forte ao longo de meses, apesar de não haver recebido luz. Embora Becquerel ainda afirmasse que a excitação pela luz aumentava a radiação emitida, Elster e Geitel não encontraram esse efeito (que, é claro, não existe). 

    A descoberta de novos materiais radioativos
    No início de 1898, dois pesquisadores, independentemente, tiveram a idéia de tentar localizar outros materiais, diferentes do urânio, que emitissem radiações do mesmo tipo. A busca foi feita, na Alemanha, por G.C. Schmidt e, na França, pela Madame Curie. Em abril de 1898, ambos publicaram a descoberta de que o tório emitia radiações, como o urânio. O método de estudo não foi fotográfico e sim com o uso de uma câmara de ionização, observando-se a corrente elétrica produzida, no ar, entre duas placas eletrizadas, quando se colocava um material que emitia radiações entre as placas. Esse método de estudos era mais seguro do que o uso de chapas fotográficas, já que estas, como vimos, podem ser afetadas por muitos tipos de influências diferentes.
    http://www.if.ufrgs.br/tex/fis142/fismod/verbetes/radiat02.jpg
    A radiação emitida pelo tório era observada em todos os seus compostos examinados, como ocorria com o urânio. Ela produzia efeitos fotográficos e era um pouco mais penetrante do que a do urânio. Schmidt afirmou ter observado a refração dos raios do tório (como Becquerel fizera anteriormente), mas não conseguiu notar nem reflexão nem polarização dos raios.
    Marie Curie estudou vários minerais, além de substâncias químicas puras. Notou, como era de se esperar, que todos os minerais de urânio e de tório emitiam radiações. Mas observou um fato estranho:
    "Todos os minerais que se mostraram ativos contêm os elementos ativos. Dois minerais de urânio - a pechblenda [óxido de urânio] e a calcolita [fosfato de cobre e uranila] são muito mais ativos do que o próprio urânio. Esse fato é muito notável e leva a crer que esses minerais podem conter um elemento muito mais ativo do que o urânio. Reproduzi a calcolita pelo processo de Debray com produtos puros; essa calcolita artificial não é mais ativa do que outros sais de urânio" .
    Nesse mesmo trabalho, Marie Curie chama a atenção para o fato de que o urânio e o tório são os elementos de maior peso atômico (dos que eram conhecidos). Especula também sobre a causa do fenômeno. Diante da enorme duração da radiação, parecia absurdo, na época, que toda a energia emitida (que parecia infinita) pudesse provir do próprio material. Marie Curie supõe que a fonte seria externa, ou seja, que todo o espaço estaria permeado por uma radiação muito penetrante, imperceptível, que seria absorvida pelos elementos mais pesados e reemitida sob uma forma observável.
    A descoberta do efeito produzido pelo tório deu novo impulso à pesquisa dos "raios de Becquerel". Agora, percebia-se que esse não era um fenômeno isolado, que ocorria só no urânio. Marie Curie é quem dá a esse fenômeno o nome "radioatividade":
    "Os raios urânicos foram freqüentemente chamados raios de Becquerel. Pode-se generalizar esse nome, aplicando-o não apenas aos raios urânicos, mas também aos raios tóricos e a todas as radiações semelhantes.
    Chamarei de radioativas as substâncias que emitem raios de Becquerel. O nome de hiperfosforescência que foi proposto para o fenômeno, parece-me dar uma falsa idéia de sua natureza".
    Vê-se que Marie Curie estava consciente de que se tratava de um fenômeno muito mais geral.
    Poucos meses depois da descoberta do efeito produzido pelo tório, Marie e Pierre Curie apresentarão um trabalho de ainda maior importância. No trabalho anterior, Marie Curie havia sugerido que a pechblenda talvez contivesse outro material radioativo, desconhecido. Ela se empenha no trabalho de tentar isolar essa substância. Para isso, dedica-se a um trabalho de química analítica, separando progressivamente os constituintes da pechblenda, testando-os pelo método elétrico, de modo a separar as frações radioativas das inativas. Primeiramente, partindo da pechblenda que era duas vezes e meia mais ativa do que o urânio, foi feita a dissolução do mineral em ácido. Depois, borbulhou-se ácido sulfídrico (H2S) pelo líquido, havendo formação de vários sulfetos insolúveis, que se precipitavam. O urânio e o tório permaneciam dissolvidos. O precipitado era muito ativo. Adicionando-lhe sulfeto de amônia, os sulfetos de arsênico e de antimônio (não ativos) se dissolvem. O resíduo passa por outros processos de separação. Por fim, o material ativo fica unido ao bismuto, não sendo separável dele pelos processos usuais. Não era, portanto, nenhum elemento conhecido. Através de processos de sublimação fracionada foi possível obter um material (ainda unido ao bismuto) que era 400 vezes mais ativo do que o urânio puro. O casal Curie sugere:
    "Cremos portanto que a substância que retiramos da pechblenda contém um metal ainda não identificado, vizinho ao bismuto por suas propriedades analíticas. Se a existência desse novo metal for confirmada, propomos dar-lhe o nome de polônio, nome do país de origem de um de nós".
    Não se pode dizer que estivesse, de fato, estabelecida a existência de um novo elemento. O suposto novo metal se comportava como o bismuto e não tinha raias espectrais que pudessem ser notadas. Houve por isso certo ceticismo em relação a essa descoberta, inicialmente.
    Em artigo escrito após o trabalho relativo ao polônio, Marie Curie faz uma revisão dos conhecimentos sobre o assunto. Nele, coloca em dúvida a existência de reflexão, refração e polarização dos raios de Becquerel e nega, com base nos estudos de Elster e Geitel, a possibilidade de intensificar a radioatividade pela exposição ao Sol. Marie Curie defende claramente a idéia de que a radioatividade é uma propriedade atômica.
    Na última reunião de 1898 da Academia de Ciências, os Curie e Bémont apresentavam um novo trabalho. Nele, apresentam evidências de um novo elemento radioativo, quimicamente semelhante ao bário, extraído também da pechblenda. Também nesse caso, não foi possível separar o novo elemento do metal conhecido; mas foi possível obter um material 900 vezes mais ativo do que o urânio. Além disso, desta vez a análise espectroscópica permitiu notar uma raia espectral desconhecida. Os autores do artigo dão a esse novo elemento o nome de "rádio", por parecer mais radioativo do que qualquer outro elemento. 

    Etapas posteriores
    Faltava muita coisa, ainda, a ser compreendida. O que eram as radiações emitidas: iguais aos raios X, ou não? Até essa época, parecia que sim. De onde saía a energia desprendida desses materiais? Por que alguns elementos são radioativos e outros não? Nada disso havia sido esclarecido. Não havia, também, suspeita de que a radioatividade acarretava transformações de um elemento químico em outro. O nome "radioatividade" existia, mas não se conhecia ainda o complexo fenômeno ao qual damos hoje esse nome.
    A história restante é longa e rica. Não é possível descrevê-la em detalhes, aqui. O objetivo central deste capítulo era mostrar que Becquerel ficou longe de estabelecer a existência da radioatividade, tal como a concebemos hoje. Vamos, por isso, apenas indicar alguns dos episódios posteriores, para dar uma idéia sobre o que faltava ainda descobrir.
    A natureza e diversidade das radiações emitidas por materiais radioativos foram estabelecidas gradualmente. No início de 1899, Rutherford notou a existência de dois tipos de radiação de urânio - uma mais penetrante e outra facilmente absorvida. Chamou-as de a (a menos penetrante) e b. No entanto, imaginou que ambas eram diferentes tipos de raios X. No final de 1899, Geisel observou que as radiações de polônio eram desviáveis por um ímã. Esses raios não podiam, portanto, ser raios X. O casal Curie verificou que alguns raios eram defletidos pelo ímã e outros não. Os que eram defletidos correspondiam à radiação b de Rutherford. O sentido da deflexão mostrou que eram semelhantes aos raios catódicos, ou seja, dotados de carga elétrica negativa. Posteriormente, o casal Curie observou, por medidas elétricas, que essa radiação transportava de fato uma carga negativa. A radiação não defletida foi identificada como radiação a (que, na verdade, é pouco desviada, por sua grande razão massa/carga).
    Becquerel, nessa fase, fez alguns estudos sobre a deflexão dessas radiações. Tentou defletir a radiação b por um campo elétrico, mas não conseguiu, inicialmente. Isso foi conseguido em 1900, por E. Dorn. No mesmo ano, Villard descobriu que os raios não desviáveis eram de dois tipos: os raios a (pouco penetrantes) e outros raios muito penetrantes, que foram denominados "raios g". Apenas em 1903, Rutherford observou que a radiação a podia ser defletida elétrica e magneticamente, verificando então tratar-se de partículas com carga positiva. Só então ficou mais clara a noção a respeito da natureza dessas três radiações.
    Outro aspecto da radioatividade - a transformação dos elementos radioativos - emergiu também aos poucos. Em 1899, Rutherford observou a existência de uma emanação radioativa do tório. Dorn verificou que o rádio também produzia uma emanação semelhante. Depois de vários meses, verificou-se tratar-se de um novo elemento químico, gasoso (radônio). Esse gás estava sendo produzido pelo material radioativo. Além disso, os Curie haviam notado, no final de 1899, que o rádio podia tornar radioativos os corpos próximos. No ano seguinte, Rutherford descobriu que a radioatividade induzida era devido a um depósito criado pela emanação gasosa. No entanto, esse depósito não era idêntico à emanação.
    Descobriu-se também que a emanação e o depósito perdiam rapidamente suas radioatividades, o que mostrou tratar-se de uma mudança atômica gradual. Após esses e outros estudos, Rutherford e Soddy apresentaram a teoria das transformações radioativas em 5 artigos publicados de novembro de 1902 a maio de 1903. Com esses trabalhos, as linhas gerais da nova visão sobre a radioatividade haviam já sido estabelecidas. Muitos aspectos foram esclarecidos nos anos seguintes.

    Comentários finais
    Mais do que diminuir o papel de Becquerel na descoberta da radioatividade, o objetivo deste capítulo foi mostrar a grande dificuldade existente no estabelecimento de fenômenos que não são esperados teoricamente. É fácil observar o que se prevê - aliás, como se viu, pode-se observar o que foi previsto até quando a previsão é falsa. Muito mais difícil é ver aquilo que contraria todas as expectativas.
    O estudo aprofundado de episódios como esse deveria fazer parte da educação de todo cientista experimental, pois a visão estereotipada do experimentador rebaixa e banaliza o trabalho experimental - quando, na verdade, o bom trabalho experimental é extremamente difícil, criativo e instigante, desde que se tenha coragem de enfrentar, no laboratório, fenômenos que se recusam a respeitar as teorias estabelecidas.
    Fonte: página do Instituto de Física - UFRGS


    Surgimento da televisão


    O aparecimento da televisão deve-se a grandes matemáticos e físicos, pertencentes às ciências exatas que entregaram para as ciências humanas um grande e poderoso veículo. Desde o início do século XIX, os cientistas estavam preocupados com a transmissão de imagens à distância e foi com invento de Alexander Bain, em 1842, que se obteve a transmissão telegráfica de uma imagem (fac-símile), atualmente conhecido como fax.
    Em 1817, o químico sueco Jons Jacob Berzelius descobriu o selênio, mas só 56 anos depois, em 1873, que o inglês Willoughby Smith comprovou que o selênio possuía a propriedade de transformar energia luminosa em energia elétrica. Através desta descoberta pode-se formular a transmissão de imagens por meio da corrente elétrica.
    Em 1884, o jovem alemão Paul Nipkow inventou um disco com orifícios em espiral com a mesma distância entre si que fazia com que o objeto se subdividisse em pequenos elementos que juntos formam uma imagem.
    Em 1892, Julius Elster e Hans Getiel inventaram a célula fotoelétrica sinal elétrico. Em que transformou cada subdivisão em 1906, Arbwehnelt desenvolveu um sistema de televisão por raios catódicos, sendo que o mesmo ocorreria na Rússia por Boris Rosing. O sistema empregava a exploração mecânica de espelho somada ao tubo de raios catódicos. Em 1920, realizaram-se as verdadeiras transmissões, graças ao inglês John Logie Baird, através do sistema mecânico baseado no invento de Nipkow. Quatro anos depois, em 1924, Baird transmitiu contornos de objetos à distância e no ano seguinte, fisionomias de pessoas. Já em 1926, Baird fez a primeira demonstração no Royal Institution em Londres para a comunidade científica e logo após assinou contrato com a BBC para transmissões experimentais. O padrão de definição possuía 30 linhas e era mecânico.
    Nesse período, em 1923, o russo Wladimir Zworykin descobriu o iconoscópio, invento que utilizava tubos de raios catódicos. Em 1927, também Philo Farnsworth descobriu um sistema dissecador de imagens por raios catódicos, mas com nível de resolução não satisfatório. Zworykin foi convidado pela RCA a encabeçar a equipe que produziria o primeiro tubo de televisão, chamado orticon, que passou a ser produzido em escala industrial a partir de 1945.
     Em Março de 1935, emite-se oficialmente a televisão na Alemanha, e em Novembro na França, sendo a Torre Eiffel o posto emissor. 
    Em 1936, Londres utiliza imagens com definição de 405 linhas e inaugura-se a estação regular da BBC. No ano seguinte, três câmaras eletrônicas transmitem a cerimônia da Coroação de Jorge VI, com cerca de cinquenta mil telespectadores.
    Na Rússia, a televisão começa a funcionar em 1938 e nos Estudos Unidos, em 1939. Durante a Segunda Guerra Mundial, a Alemanha foi o único país europeu que a manter a televisão no ar.
    Paris voltou com as transmissões em Outubro de 1944, Moscou em Dezembro de 1945 e a BBC em Junho de 1946, com a transmissão do desfile da vitória. Em 1950, a França possuía uma emissora com definição de 819 linhas, a Inglaterra com 405 linhas, os russos com 625 linhas e Estados Unidos e Japão com 525 linhas. Em Setembro desse mesmo ano, inaugura-se a TV Tupi de São Paulo, pertencente ao jornalista Assis Chateaubriand, dono dos Diários Associados, com sistema baseado no americano.
     Em resumo pode-se dizer que a câmara de TV capta as imagens, decompondo-as em sinais elétricos que são mandados para um centro eletrônico, o modelador (aparelho que modula as ondas em um oscilador). Os sinais são enviados em forma de ondas por uma grande antena transmissora que é encaminhada ao aparelho receptor que desfaz os sinais, recompondo-os na sua posição original, reproduzindo na tela a imagem transmitida.
    A formação da imagem é instantânea. O dispositivo eletrônico utiliza-se de pontinhos, ao invés de linhas, conseguindo desenhar o frame (imagem) inteiro a cada 1/25 de segundo. Para transmitir a imagem de um lugar para o outro utilizou-se antenas, mas como mas como as ondas são em linha reta ficou difícil transmitir para o outro lado do globo terrestre, devido à curvatura, procurando deste modo uma solução espacial. Em 23 de Julho de 1962, a primeira transmissão via satélite, o satélite artificial Telstar, lançado pela NASA dos E.U.A.
    O progresso da engenharia espacial e das telecomunicações permitiu lançar satélites em órbita à volta da Terra. São eles que garantem as transmissões televisivas e as comunicações telefônicas intercontinentais que permitem comunicar um mesmo sinal em todo o mundo ao mesmo tempo.

    Início das transmissões em cores
    As transmissões regulares a cores nos E.U.A., começaram em 1954. Mas já em 1929, Hebert Eugene Ives realizou, em Nova Iorque, as primeiras imagens coloridas com 50 linhas de definição por fio, cerca de 18 frames por segundo. Peter Goldmark aperfeiçoou o invento mecânico fazendo demonstrações com 343 linhas, a 20 frames por segundo, em 1940.
    Vários sistemas foram criados, mas todos iam de encontro a uma forte barreira: se um sistema novo surgisse, o que fazer com os aparelhos antigos a preto e branco que já eram cerca de 10 milhões no início dos anos 50? Criou-se nos Estados Unidos um comitê especial para, no sentido literal, colocar cor no sistema preto e branco. Esse comitê recebeu o nome de National Television System Committee (também conhecido como National Television Standards Committee), cujas iniciais serviam para dar nome ao novo sistema, NTSC. O sistema desenvolvido baseava-se em utilizar o padrão a preto e branco que trabalhava com níveis de luminância (Y) e acrescentaram a cronomância (C), ou seja, a cor. O princípio de captar e receber as imagens em cores está na decomposição da luz branca em três cores primárias que são o vermelho (R de red), o verde (G de green) e o azul (B de blue). Numa proporção de níveis de 30% de R, 59% de G e 11% de B. Na recepção o processo é inverso, a imagem compõem-se através das somatórias das cores de pixel, ou seja, nos pontos da tela do televisor.
    Em 1967, entra em funcionalidade, na Alemanha, uma variação do sistema americano, resolvendo algumas debilidades desse sistema que recebeu o nome de Phase Alternation Line, dando as iniciais para o sistema PAL.
    Nesse mesmo ano, entrou na França o SECAM (Séquentille Coleur à Memoire), mas não compatível com o sistema a preto e branco francês.
    A primeira transmissão oficial a cores no Brasil deu-se em 31 de Março de 1972. O desenvolvimento da TV foi tão grande que os canais disponíveis de VHF (Very High Frequency, isto é, frequência bastante alta) ficaram saturados, ampliando assim a utilização da faixa de UHF (Ultra High Frequency, isto é, frequência ultra-alta). Assim os fabricantes de televisores foram obrigados a construir um aparelho capaz de captar todos os canais para que os programas da faixa de UHF ficassem acessíveis.
    A transmissão de um programa ao vivo exige a participação de uma equipe numerosa e altamente qualificada que se pode dividir em quatro grupos: pessoal da cena, controle de cor e iluminação, controle de som e direção. Todos figuram nesse esquema de um estúdio atual.
    Fonte: http://www.notapositiva.com


    História da Eletricidade
    Foi descoberta por um filósofo grego chamado Tales de Mileto que, ao esfregar um âmbar a um pedaço de pele de carneiro, observou que pedaços de palhas e fragmentos de madeira começaram a ser atraídas pelo próprio âmbar.
    Do âmbar (gr. élektron) surgiu o nome eletricidade. No século XVII foram iniciados estudos sistemáticos sobre a eletrificação por atrito, graças a Otto von Guericke. Em 1672, Otto inventa uma maquina geradora de cargas elétricas onde uma esfera de enxofre gira constantemente atritando-se em terra seca. Meio século depois, Stephen Gray faz a primeira distinção entre condutores e isolantes elétricos.
    Durante o século XVIII as maquinas elétricas evoluem até chegar a um disco rotativo de vidro que é atritado a um isolante adequado. Uma descoberta importante foi o condensador, descoberto independentemente por Ewald Georg von Kleist e por Petrus van Musschenbroek. O condensador consistia em uma maquina armazenadora de cargas elétricas. Eram dois corpos condutores separados por um isolante delgado.
    Mas uma invenção importante, de uso prático foi o pára-raios, feito por Benjamin Franklin. Ele disse que a eletrização de dois corpos atritados era a falta de um dos dois tipos de eletricidade em um dos corpos. esses dois tipos de eletricidade eram chamadas de eletricidade resinosa e vítrea.
    No século XVIII foi feita a famosa experiência de Luigi Aloisio Galvani em que potenciais elétricos produziam contrações na perna de uma rã morta. Essa diferença foi atribuída por Alessandro Volta ao fazer contato entre dois metais a perna de uma outra rã morta. Essa experiência foi atribuída a sua invenção chamada de pilha voltaica. Ela consistia em um serie de discos de cobre e zinco alterados, separados por pedaços de papelão embebidos por água salgada.
    Com essa invenção, obteve-se pela primeira vez uma fonte de corrente elétrica estável. Por isso, as investigações sobre a corrente elétrica aumentaram cada vez mais.
    Depois de um tempo, são feitas as experiências de decomposição da água. Em 1802, Humphry Davy separa eletronicamente o sódio e potássio.
    Mesmo com a fama das pilhas de Volta, foram criadas pilhas mais eficientes. John Frederic Daniell inventou-as em 1836 na mesma época das pilhas de Georges Leclanché e a bateria recarregável de Raymond-Louis-Gaston Planté.
    O físico Hans Christian Örsted observa que um fio de corrente elétrica age sobre a agulha de uma bússola. Com isso, percebe-se que há uma ligação entre magnetismo e eletricidade.
    Em 1831, Michael Faraday descobre que a variação na intensidade da corrente elétrica que percorre um circuito fechado induz uma corrente em uma bobina próxima. Uma corrente induzida também é observada ao se introduzir um ímã nessa bobina. Essa indução magnética teve uma imediata aplicação na geração de correntes elétricas. Uma bobina próxima a um imã que gira é um exemplo de um gerador de corrente elétrica alternada.
    Os geradores foram se aperfeiçoando até se tornarem as principais fontes de suprimento de eletricidade empregada principalmente na iluminação.
    Em 1875 é instalado um gerador em Gare du Nord, Paris, para ligar as lâmpadas de arco da estação. Foram feitas maquinas a vapor para movimentar os geradores, e estimulando a invenção de turbinas a vapor e turbinas para utilização de energia hidrelétrica. A primeira hidrelétrica foi instalada em 1886 junto as cataratas do Niágara.
    Para ocorrer a distribuição de energia, foram criados inicialmente condutores de ferro, depois os de cobre e finalmente, em 1850, já se fabricavam os fios cobertos por uma camada isolante de guta-percha vulcanizada, ou uma camada de pano.
    A Publicação do tratado sobre eletricidade e magnetismo, de James Clerk Maxwell, em 1873, representa um enorme avanço no estudo do eletromagnetismo. A luz passa a ser estendida como onda eletromagnética, uma onde que consiste de campos elétricos e magnéticos perpendiculares à direção de sua propagação.
    Heinrich Hertz, em suas experiências realizadas a partir de 1885, estuda as propriedades das onde eletromagnéticas geradas por uma bobina de indução; nessas experiências observa que se refletidas, refratadas e polarizadas, do mesmo modo que a luz. Com o trabalho de Hertz fica demonstrado que as ondas de radio e as de luz são ambas ondas eletromagnéticas, desse modo confirmando as teorias de Maxwell; as ondas de radio e as ondas luminosas diferem apenas na sua freqüência.
    Hertz não explorou as possibilidades práticas abertas por suas experiências; mais de dez anos se passam, até Guglielmo Marconi utilizar as ondas de radio no seu telegrafo sem fio. A primeira mensagem de radio é transmitida através do Atlântico em 1901. Todas essas experiências vieram abrir novos caminhos para a progressiva utilização dos fenômenos elétricos sem praticamente todas as atividades do homem.




    A Descoberta dos Raios X

    Introdução

    No fim da tarde de 8 de novembro de 1895, quando todos haviam encerrado a jornada de trabalho, o físico alemão Wilhelm Conrad Roentgen (1845-1923) continuava no seu pequeno laboratório, sob os olhares atentos do seu servente. Enquanto Roentgen, naquela sala escura, se ocupava com a observação da condução de eletricidade através de um tubo de Crookes, o servente, em alto estado de excitação, chamou-lhe a atenção: "Professor, olhe a tela!".
    Nas proximidades do tubo de vácuo havia uma tela coberta com platino-cianeto de bário, sobre a qual se projetava uma inesperada luminosidade, resultante da fluorescência do material. Roentgen girou a tela, de modo que a face sem o material fluorescente ficasse de frente para o tubo de Crookes; ainda assim ele observou a fluorescência. Foi então que resolveu colocar sua mão na frente do tubo, vendo seus ossos projetados na tela. Roentgen observava, pela primeira vez, aquilo que passou a ser denominado raios X.
    http://www.if.ufrgs.br/tex/fis142/fismod/mod06/images/crook03.jpg
    O parágrafo acima pode ser uma dramatização do que de fato ocorreu naquele dia, mas o fato que a história registra é que esta fantástica descoberta teve estrondosa repercussão, não apenas na comunidade científica, como também nos meios de comunicação de massa. Por exemplo, em 1896, menos de um ano após a descoberta, aproximadamente 49 livros e panfletos e 1.000 artigos já haviam sido publicados sobre o assunto. Um levantamento feito por Jauncey no jornal norte-americano St. Louis Post-Dispatch, mostra que, entre 7 de janeiro e 16 de março de 1896, quatorze notas foram publicadas sobre a descoberta e outros estudos relacionados.
    Todavia, as mais conhecidas referências a essa descoberta tendem a minimizar o mérito do seu autor, enfatizando o aspecto fortuito da observação. Essa visão distorcida que se tem do trabalho de Roentgen só é eliminada quando se toma conhecimento dos seus relatos. Com 50 anos de idade na época da descoberta dos raios X, e menos de 50 trabalhos publicados, Roentgen tinha como temas prediletos as propriedades físicas dos cristais e a física aplicada (em 1878 apresentou um alarme para telefone, e em 1879, um barômetro aneróide). Sobre os raios X publicou apenas três trabalhos, e ao final da sua vida não chegou a ultrapassar a marca dos 60. Para um detentor do Prêmio Nobel de Física, esta é uma quantidade relativamente inexpressiva. Essa "pequena" produção talvez seja conseqüência do seu rigoroso critério de avaliação dos resultados obtidos. Pelo que se sabe, ele era tão cuidadoso, que jamais teve de revisar os resultados publicados. Lendo seus dois primeiros artigos sobre os raios X, percebe-se a acuidade do seu trabalho.
    Além da inegável importância na medicina, na tecnologia e na pesquisa científica atual, a descoberta dos raios X tem uma história repleta de fatos curiosos e interessantes, e que demonstram a enorme perspicácia de Roentgen. Por exemplo, Crookes chegou a queixar-se da fábrica de insumos fotográficos Ilford, por lhe enviar papéis "velados". Esses papéis, protegidos contra a luz, eram geralmente colocados próximos aos seus tubos de raios catódicos, e os raios X ali produzidos (ainda não descobertos) os velavam. Outros físicos observaram esse "fenômeno" dos papéis velados, mas jamais o relacionaram com o fato de estarem próximos aos tubos de raios catódicos! Mais curioso e intrigante é o fato de que Lenard "tropeçou" nos raios X antes de Roentgen, mas não percebeu. Assim, parece que não foi apenas o acaso que favoreceu Roentgen; a descoberta dos raios X estava "caindo de madura", mas precisava de alguém suficientemente sutil para identificar seu aspecto iconoclástico. Para entender por que, é necessário acompanhar a história dos raios catódicos.

    Raios Catódicos e Raios Lenard versus Raios X

    Em 1838, Faraday realizou uma série de experimentos com descargas elétricas em gases rarefeitos, ligando definitivamente seu nome à descoberta dos raios catódicos. Todavia, devido às dificuldades técnicas com a produção de vácuo de boa qualidade, esses trabalhos só tiveram novo impulso vinte anos depois. Essa nova fase, iniciada por volta de 1858, pelo físico alemão Julius Plücker (1801-1868), produziu resultados que desafiaram a inteligência humana durante quase quarenta anos, até que um bom entendimento do fenômeno fosse obtido. A denominação raios catódicos (Kathodenstrahlen) foi introduzida pelo físico alemão Eugen Goldstein (1850-1931), em 1876, ocasião em que ele apresentou a interpretação de que esses raios eram ondas no éter. Uma interpretação contrária, defendida pelos ingleses, também chamava a atenção do mundo científico da época. Para Crookes, os raios catódicos eram moléculas carregadas, as quais constituíam o quarto estado da matéria (essa denominação é hoje usada quando nos referimos ao plasma, que é exatamente o que se tem quando se produz uma descarga elétrica num gás rarefeito!). Em 1897, Thomson encerrou a polêmica, demonstrando que os raios catódicos eram elétrons. Ao longo desses 40 anos, diversas observações, comentários e hipóteses sugerem que vários pesquisadores andaram "rondando a porta da descoberta dos raios X". Anderson relaciona algumas dessas indicações; nos seus dois primeiros trabalhos, Roentgen se refere às possibilidades que Lenard teve de fazer a descoberta.
    Num artigo publicado em 1880, Goldstein menciona que uma tela fluorescente podia ser excitada, mesmo quando protegida dos raios catódicos. Publicado em alemão e em inglês, este trabalho deve ter chegado ao conhecimento de quase todos os pesquisadores envolvidos nesses estudos, no entanto, nos quinze anos seguintes ninguém questionou o fato de que a tela fluorescia, mesmo sem ser atingida pelos raios catódicos! Também Thomson chegou perto; um ano antes da descoberta dos raios X, ele relatou que havia observado fosforescência em peças de vidro colocadas a vários centímetros de distância do tubo de vácuo.
    Entre todos os pesquisadores, Lenard parece ter sido aquele que mais se aproximou da descoberta de Roentgen. Dando continuidade aos trabalhos do seu professor, Heinrich Hertz, Lenard realizou experiências para verificar se os raios catódicos produzidos no interior de um tubo de Crookes poderiam ser observados no exterior. Para tanto, construiu um tubo de Crookes com uma pequena janela de alumínio (espessura de aproximadamente 0,0025 mm) no lado oposto ao catodo, e passou a observar os raios catódicos fora do tubo, através da sua interação com materiais fosforescentes. Posteriormente esses raios ficaram conhecidos como raios Lenard. Em 1894 Lenard publica, na revista alemã Annalen der Physik, suas primeiras observações, entre as quais se destacam:
    1. Os raios Lenard sensibilizavam uma chapa fotográfica.
    2. Um disco de alumínio eletricamente carregado descarregava-se quando era colocado no trajeto desses raios, mesmo quando este disco era colocado a uma distância superior a 8 cm (o alcance máximo dos raios catódicos no ar). Quando a mão era colocada na frente do feixe, o efeito de descarga elétrica desaparecia. Comentando esses resultados, Lenard escreveu: "Não se pode afirmar se estamos observando uma ação dos raios catódicos sobre a superfície da janela de alumínio, ou sobre o ar, ou finalmente sobre o disco carregado! Todavia, a última ação é bastante improvável a grandes distâncias da janela".
    3. Os raios eram defletidos continuamente por um campo magnético; isto é, alguns raios eram defletidos mais do que outros, e existiam alguns que não se defletiam.
    De tudo que se sabe hoje, conclui-se que os raios Lenard eram constituídos de raios catódicos (elétrons) e de raios X, mas ele acreditava que eram apenas raios catódicos! Bastava que ele tivesse usado uma janela de alumínio bastante espessa, de tal modo que os elétrons não pudessem atravessá-la, para ter um feixe de raios X! De acordo com Anderson, Lenard ficou profundamente desapontado por ter deixado escapar essa descoberta, e jamais usou o nome de Roentgen quando se referia aos raios X.
    O fortuito 8 de novembro de 1895
    Na última década do século passado, as pesquisas sobre os raios catódicos constituíam o tema mais efervescente em toda a Europa, de modo que parece natural o desejo de Roentgen, então diretor do Instituto de Física da Universidade de Würzburg, de repetir algumas das experiências divulgadas. De acordo com Fuchs e Romer, os experimentos de Roentgen tiveram início em 1894, mas quase toda a literatura histórica dá conta de que esses trabalhos iniciaram em 1895. Mais adiante discutiremos esse pequeno mistério. Apresentaremos aqui o que se sabe dos fatos ocorridos a partir daquela sexta-feira, 8 de novembro de 1895.
    A literatura sobre a evolução dos fatos apresenta algumas controvérsias, mas uma coisa parece certa: Roentgen não trabalhou com os raios X mais do que 3 anos. Além disso, em menos de 8 semanas ele descobriu praticamente todas as propriedades fundamentais desses, escreveu três trabalhos sobre o assunto, e já em 1897 estava de volta aos seus temas favoritos, abandonando um assunto de tanta fertilidade, que proporcionou a obtenção do Prêmio Nobel de Física, não apenas a ele (1901), como também a Lenard (1905), Thomson (1906), Laue (1914), W.H. Bragg e W.L. Bragg (1915), Barkla (1917) e Siegbahn.(1924).
    Numa carta enviada em fevereiro de 1896 ao seu grande amigo Ludwig Zehnder, Roentgen diz que, durante os experimentos, não falou a ninguém sobre o seu trabalho, exceto à sua esposa. Assim, o parágrafo que inicia o presente artigo, extraído de um relato de Manes, pode ser falso; ele foi usado aqui como força de expressão dramática. O que se sabe é que em 28 de dezembro de 1895 Roentgen encaminhou ao presidente da Sociedade de Física e Medicina de Würzburg (SFMW) um manuscrito, intitulado "Sobre um novo tipo de raios" ("On a new kind of rays", ou, em alemão, "Ueber eine neue art von strahlen"), que ele considera como uma "comunicação preliminar". Pela profundidade e concisão com que os resultados são apresentados, não surpreende que este tenha sido o mais importante dos três trabalhos publicados por Roentgen. Em 9 de março de 1896 ele envia, à mesma sociedade, sua segunda comunicação, com o mesmo título da primeira. Em seu artigo, Watson transcreve essas duas comunicações; as versões originais, em alemão, e as traduções, em inglês. Segundo Jauncey, o terceiro artigo é datado de 10 de março de 1897. Na edição de 23 de janeiro de 1896, Nature publica uma versão inglesa da primeira comunicação, sendo imediatamente reproduzida em Science, Scientific American Supplement, Journal of the Franklin Institute e na revista popular Review of Reviews (semelhante aReader’s Digest). A revista alemã Annalen der Physik, em sua edição de 1o de janeiro de 1898, reproduz os três artigos. Cópias do primeiro trabalho, com a radiografia de uma mão, foram enviadas, entre o final de dezembro e o início de janeiro, aos principais cientistas da Europa, que assim tomaram conhecimento da grande descoberta, uma vez que os anais da SFMW tinham circulação bastante limitada, praticamente local.
    Roentgen recebeu inúmeros convites para conferências, mas parece que declinou de todas, excepto uma, apresentada na SFMW, em 23 de janeiro de 1896, na qual obteve enorme sucesso, apesar da sua reconhecida timidez. Nessa conferência, ele tirou várias radiografias, inclusive uma que ficou famosa, da mão do grande anatomista, professor da Universidade de Würzburg, A. von Kölliker. A cada radiografia que ele conseguia, a audiência reagia com entusiasmo e estrondoso aplauso.

    As duas primeiras comunicações
    As duas primeiras comunicações de Roentgen, que ele considerava como uma única, são belos exemplos de objetividade e concisão, sem deixar de lado a profundidade que o tema requer. Impressiona a quantidade de dados obtidos em tão pouco tempo, mas frustra a expectativa do leitor interessado na heurística da investigação e na montagem do equipamento; não há qualquer informação detalhada nesse sentido. Ele informa que usou uma grande bobina de Ruhmkorff, mas não especifica que tipo de tubo de vácuo usou; mais adiante discutiremos essa questão.
    Os resultados são apresentados em 21 tópicos, muitos dos quais contendo um único parágrafo, ao longo dos quais Roentgen discute praticamente todas as propriedades fundamentais dos raios X. Na ordem em que aparecem nas comunicações, são as seguintes essas propriedades. Em primeiro lugar, os raios podem ser detectados através de cintilações numa tela fosforescente, ou de impressões numa chapa fotográfica. Diferentemente dos raios catódicos, os raios X podem ser observados mesmo quando a tela é colocada a uma distância de aproximadamente dois metros do tubo de vácuo (os raios catódicos não ultrapassam mais do que oito centímetros no ar). Roentgen testa a transparência de uma quantidade enorme de materiais, verificando que duas propriedades são importantes: a densidade do material e a espessura; quanto mais denso e mais espesso, menos transparente. Depois de testar a transparência, Roentgen investiga efeitos de refração e de reflexão. Não observa nem um nem outro, embora tenha ficado em dúvida quanto à reflexão. Tenta defletir os raios X com o auxílio de um campo magnético, mas não consegue, e aqui estabelece uma das fundamentais diferenças, do ponto de vista experimental, entre os raios X e os raios catódicos, pois estes são facilmente defletidos por uma campo magnético.
    No tópico 12 ele discute uma das questões mais fundamentais para a identificação dos raios X. Ele conclui que esses raios são produzidos pelos raios catódicos na parede de vidro do tubo de descarga! Na seqüência ele informa que observou raios X produzidos pelo choque de raios catódicos numa chapa de alumínio, e promete testar outros materiais. Um ano depois, em 17 de dezembro de 1896, o físico inglês Sir George Stokes demonstrou que os raios X são produzidos pela desaceleração de partículas carregadas, um fenômeno que ocorre quando, por exemplo, elétrons com alta energia penetram num material pesado! Ou, na linguagem da época, quando os raios catódicos penetram num material pesado!
    No tópico 17, que encerra a primeira comunicação, ele discute a natureza dos raios X. Obviamente descarta a identidade com os raios catódicos. Sugere que poderia ser algo como a luz ultravioleta, devido aos efeitos fluorescentes e à impressão de chapas fotográficas, mas no cotejamento de outras propriedades chega à conclusão de que os raios X não podem ser da mesma natureza da luz ultravioleta usual. Finaliza o artigo sugerindo que os raios X poderiam ser vibrações longitudinais no éter. Como se sabe, essa hipótese era usada pelos alemães (Goldstein, Hertz, Lenard, e outros) para explicar os raios catódicos.
    No início da segunda comunicação, tópico 18, Roentgen examina a questão do efeito dos raios X sobre os corpos eletrizados, fazendo referência aos resultados publicados por Lenard. De imediato sugere que os efeitos atribuídos por Lenard aos raios catódicos, eram, de fato, devidos aos raios X produzidos na janela de alumínio do seu tubo de vácuo. (Lenard estava com os raios X ali, na sua frente, e não sabia!)
    Nos tópicos finais, 19, 20 e 21, discute questões de ordem prática: operação da bobina de indução, manutenção do vácuo e diferença entre alumínio e platina, no que concerne à intensidade do feixe produzido.

    O que mais, além do acaso?
    Para se entender a descoberta dos raios X como fruto de um planejado trabalho científico, muito mais do que um evento fortuito, seria necessário o conhecimento da heurística que orientou o planejamento da pesquisa. Infelizmente, Roentgen não dá qualquer esclarecimento sobre essa heurística. Como vimos acima, seus relatos descrevem objetivamente os resultados obtidos, sem grandes elucubrações ou conjecturas teóricas. Ao historiador resta a alternativa de especular, a partir de fatos conhecidos, na tentativa de montar um esquema racional plausível para a grande descoberta. Duas dúvidas jamais foram esclarecidas na literatura:
    Teria Roentgen usado vários tipos de tubos de vácuo? Se as informações de Fuchs e Romer estão corretas, por que Roentgen substituiu o tubo de Lenard por um tubo convencional (Hittorf ou Crookes)?
    Por que envolver o tubo com uma cartolina preta?
    Numa entrevista concedida ao jornalista Dam, em janeiro de 1896, Roentgen informa que estava usando um tubo de Crookes no momento da descoberta (8 de novembro de 1895). Numa carta enviada a Zehnder (fevereiro de 1896), ele diz que usou uma bobina de Ruhmkorff 50/20 centímetros, com interruptor Deprez, e aproximadamente 20 ampères de corrente primária. O sistema é evacuado com uma bomba Raps, ao longo de vários dias. Os melhores resultados são obtidos quando os eletrodos da descarga estão afastados por uma distância de aproximadamente 3 cm. Mais uma vez, não especifica o tipo de tubo usado; diz apenas que o fenômeno pode ser observado em qualquer tipo de tubo de vácuo, inclusive em lâmpadas incandescentes.
    Que Roentgen descobriu os raios X por acaso, parece não haver dúvida. De que outra forma algo tão inesperado poderia ser descoberto? Agora, sobre o que não se tem certeza é qual foi o acidente que proporcionou a descoberta, e em que momento ele ocorreu. É difícil de imaginar que no primeiro arranjo experimental Roentgen tenha envolvido o tubo com a cartolina. O que ele esperava ver atravessando a cartolina preta, senão raios X? Como é possível, em menos de dois meses, alguém abordar aquela enorme quantidade de aspectos fundamentais de um fenômeno desconhecido, por mais genial que seja? Por outro lado, se o "verdadeiro" momento da descoberta não é o 8 de novembro, qual a razão para Roentgen fazer-nos crer que esta é a data correta?
    Puro acidente ou não, o fato é que a repercussão da descoberta foi de tal ordem que, com muita justiça, o primeiro Prêmio Nobel de Física (1901) foi concedido a Roentgen.

    A repercussão imediata
    Em termos de repercussão imediata, a descoberta dos raios X parece ser um caso único na história da ciência. A observação do eclipse solar de 1919, que comprovou parte da teoria da relatividade geral de Einstein, é um rival de respeito quando se considera a repercussão na imprensa, mas não chega a competir, nem de leve, quando se considera a repercussão no meio científico (A recente descoberta das cerâmicas supercondutores também teve forte impacto na imprensa e na comunidade científica, mas não temos conhecimento quantitativo desse impacto). As notáveis aplicações na medicina foram imediatamente percebidas pelo próprio Roentgen, que fez uma radiografia da sua mão. Pesquisadores em todo o mundo passaram a repetir a experiência de Roentgen, não apenas na tentativa de descobrir novas aplicações, como também com o objetivo de compreender o fenômeno, uma tarefa que desafiou a inteligência humana ao longo de quase três décadas.
    A primeira grande questão referia-se à natureza da radiação. Aliás, o levantamento do noticiário feito por Jauncey mostrou a confusão que se fazia entre raios X e raios catódicos. Não apenas os jornais usavam indistintamente esses dois termos, mas também alguns físicos. É importante salientar que a descoberta de que os raios catódicos eram elétrons foi feita por Thomson dois anos após a descoberta de Roentgen. Mesmo os cientistas que não confundiam raios catódicos com raios X, não sabiam do que se tratava essa coisa descoberta por Roentgen. Existiam duas escolas de pensamento. Uma, à qual pertenciam os ingleses Thomson e Stokes, acreditava que os raios X eram vibrações transversais no éter, da mesma forma como a luz ordinária. A outra escola, à qual pertencia o alemão Lenard, defendia que os raios X eram vibrações longitudinais no éter. Depois de extensivos experimentos, a polêmica foi decidida favoravelmente à escola inglesa.
    Quando, em 1905, Einstein propôs a idéia do fóton de energia, um conceito que admitia um caráter corpuscular para a luz, foi possível calcular o comprimento de onda associado aos raios X, mas evidências experimentais do caráter corpuscular só surgiram com os trabalhos de Bragg, depois de 1908. Por volta de 1912, mais confusão veio à tona. Naquele ano, Laue e seus estudantes W. Friedrich e P. Knipping descobriram a difração dos raios X em cristais de sulfeto de zinco (ZnS), uma experiência definitiva para o estabelecimento do caráter ondulatório dos raios X. A confusão causada por essa dualidade só foi resolvida com os trabalhos de de Broglie, a partir de 1923. Portanto, a visão que se tem hoje dos raios X, é que eles pertencem ao espectro eletromagnético, e como tal apresentam a dualidade partícula-onda: dependendo das circunstâncias, evidenciam propriedades corpusculares ou ondulatórias. Ao espectro eletromagnético pertencem a luz visível, as ondas de rádio, o ultravioleta, o infravermelho e as radiações gama. Fundamentalmente, o que diferencia uma radiação de outra é o comprimento de onda. Para se ter uma idéia, o comprimento de onda da luz visível é mil vezes maior do que o dos raios X.
    Além desse enorme interesse despertado na comunidade científica, é interessante avaliar o interesse despertado na comunidade leiga, que muito contribuiu para a criação de um folclore em torno do fenômeno. A título de ilustração, vejamos algumas das mais pitorescas notícias publicadas pelo jornal norte-americano St. Louis Post-Dispatch. No dia 11 de fevereiro de 1896, saiu uma nota dando conta de uma invenção de um professor de Perugia (Itália), que permitia ao olho humano ver os raios X. No dia 13 de fevereiro, o jornal informava que Roentgen havia iluminado seu cérebro e visto sua pulsação. No dia seguinte, uma matéria relatava a opinião defendida por alguns cientistas, segunda a qual a descoberta de Roentgen poderia estabelecer novas teorias sobre a criação do mundo.
    Outras notícias extravagantes são relatadas no artigo de Jaucey. Em um jornal não identificado, uma matéria alertava para a vulnerabilidade a que todos estavam sujeitos depois da descoberta dos raios X. Qualquer um armado com um tubo de vácuo, dizia o jornal, podia ter uma visão completa do interior de uma residência. Outras notícias sugeriam aplicações fantásticas para os raios X, como a de ressucitar pessoas eletrocutadas. Um famoso engenheiro eletricista, defendendo a hipótese de que os raios X ou os raios catódicos eram ondas de som, afirmava ter ouvido a emissão desses raios. Outro engenheiro eletricista fez tentativas para fotografar o cérebro humano, mas não obteve sucesso.
    O caráter sensacionalista que o assunto estava despertando, motivou o New York Times a alertar, em 15 de março de 1896: "Sempre que algo extraordinário é descoberto, uma multidão de escritores apodera-se do tema e, não conhecendo os princípios científicos envolvidos, mas levados pelas tendências sensacionalistas, fazem conjecturas que não apenas ultrapassam o entendimento que se tem do fenômeno, como também em muitos casos transcendem os limites das possibilidades. Este tem sido o destino dos raios X de Roentgen".
    Essa enorme curiosidade levou muita gente a correr sérios riscos de saúde ao realizar suas tentativas de novas aplicações dos raios X. No dia 29 de março de 1896, o jornal St. Louis Globe-Democrat fazia o primeiro alerta público sobre o perigo dos raios X para os olhos. A propósito, há uma história, aparentemente folclórica, segunda a qual uma sapataria de Nova York tinha como grande apelo mercadológico o fato de que os sapatos sob encomenda eram testados com o auxílio dos raios X!

    Como os raios X são produzidos
    Nas suas publicações Roentgen não especifica o tipo de equipamento utilizado, mas não é difícil imaginar os possíveis componentes do seu arranjo experimental: uma bateria de corrente contínua, uma bobina de indução, um tubo de vácuo e uma bomba de vácuo. Incrementados por fantásticos desenvolvimentos tecnológicos, e recebendo diferentes denominações, esses componentes continuam em uso na moderna pesquisa científica. Na época de Roentgen, eles eram conhecidos pelos nomes dos seus descobridores. Assim, as principais baterias eram as de Volta (inventada em 1800) e as de Bunsen (1843). Entre as bobinas de indução, as de Ruhmkorff (1851) eram as mais famosas.
    No que se refere à utilização do vácuo, a primeira experiência que se tem notícia foi realizada pelo italiano Gasparo Berti, por volta de 1640. A partir desses experimentos, passando pelo barômetro de Torriceli (1644) e pela primeira bomba de vácuo construída por Guericke (1650), chegamos às diversas bombas disponíveis no final do século passado, entre as quais se destacam: a bomba de pistão-duplo de Hauksbee (1709), as bombas de mercúrio de Geissler (1855), de Toepler (1862) e de Sprengel (1873), e a bomba de óleo de Fluess (1892). Na carta enviada a Zehnder, Roentgen informa que usou uma bomba Raps, cuja descrição não se encontra na literatura pertinente.
    A elaboração de tubos de vácuo para observação de descarga elétrica teve início com os trabalhos de William Morgan, por volta de 1785, e consistência experimental com os resultados obtidos por Faraday, por volta de 1833. Todavia, foi somente depois dos desenvolvimentos das bombas de vácuo, ocorridos depois de 1850, que as pesquisas sobre descargas elétricas em gases rarefeitos tiveram considerável impulso. Em conseqüência, os tubos de vácuo mais conhecidos levam os nomes dos pesquisadores dessa época. Destacam-se os tubos de: Geissler, Pluecker, Hittorf, Crookes e Lenard.
    A título de recuperação histórica, apresentaremos breves descrições dos possíveis equipamentos utilizados por Roentgen.
    A bobina de Ruhmkorff, funcionando segundo o princípio do transformador de corrente, é capaz de produzir altas voltagens. Ela contém duas bobinas enroladas em um núcleo de ferro, e isoladas entre si. A bobina interna (primária) é feita com um fio relativamente curto (de 30 a 50 metros), enquanto a externa (secundária) é feita com um fio muito longo (centenas de quilômetros). Para o funcionamento do equipamento, usa-se uma bateria de corrente contínua (p. ex. bateria de Volta) para fornecer uma determinada voltagem à bobina primária. Quando a corrente é subitamente interrompida, uma voltagem maior é induzida na bobina secundária. O fator de transformação da voltagem é proporcional à razão dos comprimentos dos fios. As bobinas utilizadas no final do século passado produziam tensões de milhares de volts. A interrupção da corrente pode ser realizada, por exemplo, com o auxílio de um interruptor usado nas transmissões telegráficas de código Morse. As potências dessas bobinas, medidas pelo comprimento da centelha que elas produziam, serviam para classificar os laboratórios da época. Para se ter uma idéia da ordem de grandeza, a Royal Institution of London preserva uma grande bobina de Ruhmkorff com 280 milhas de fio na bobina secundária, e capaz de produzir centelhas com 42 polegadas de comprimento.
    Parece certo que o primeiro tubo de vácuo utilizado por Roentgen foi um tubo de Lenard, mas, aparentemente, ele comprou outros tubos de raios catódicos convencionais. A diferença essencial entre um e outro tipo de tubo, é que o de Lenard possui uma janela de alumínio, projetada para permitir o estudo dos raios catódicos no seu exterior. Confeccionados em vidro, esses tubos possuíam apenas dois eletrodos no seu interior. Com o uso cada vez mais freqüente dos raios X, outros tubos passaram a ser construídos. Até 1913, o mais usado era o tubo de focalização, mas logo depois passou a ter larga aceitação o tubo de Coolidge, um modelo ainda usado nos dias atuais.
    Do que se sabe, podemos imaginar o seguinte procedimento adotado por Roentgen: os terminais da bobina de Ruhmkorff foram ligados aos eletrodos do tubo de vácuo; com a manipulação de um interruptor do tipo telégrafo alta voltagem era produzida entre os terminais; o choque do feixe de raios catódicos (elétrons) com o anodo (eletrodo positivo) produzia os raios X. Na essência, o procedimento utilizado atualmente é o mesmo. Costuma-se distinguir dois tipos de raios X produzidos nesse processo. Um deles constitui o espectro contínuo, bremsstrahlung em alemão, e resulta da desaceleração do elétron durante a penetração no anodo. O outro tipo é o raio X característico do material do anodo. Assim, cada espectro de raios X é a superposição de um espectro contínuo e de uma série de linhas espectrais características do anodo.

    Os Raios X e a Tabela Periódica
    Por volta de 1913, Moseley mediu as freqüências das linhas espectrais dos raios X característicos de cerca de 40 elementos. A partir do gráfico da raiz quadrada da freqüência versus o número atômico Z do elemento, ele obteve uma relação que passou a ser conhecida como lei de Moseley (veja detalhes no texto sobre os conceitos elementares de raios X). A repercussão imediata deste resultado foi a alteração da tabela periódica. Esse trabalho de Moseley teve papel importantíssimo na consolidação e aceitação internacional do modelo de Bohr. Na verdade, foi o primeiro dos trabalhos experimentais a confirmar as predições de Bohr. Em carta escrita a Bohr no dia 16 de novembro de 1913, Moseley observa que a sua fórmula poderia ser escrita numa forma idêntica àquela obtida com o modelo de Bohr.
    Antes do trabalho de Moseley o número atômico era associado à posição do átomo na tabela periódica de Mendelev, a qual distribuía os elementos de acordo com o seu peso. Moseley mostrou, por exemplo, que o argônio deveria ter Z=18, ao invés de Z=19 (conforme a tabela de Mendelev). Por outro lado, o potássio deveria ter Z=19, ao invés de Z=18. Ele também mostrou que o cobalto deve preceder ao níquel, apesar do peso atômico do Co ser maior do que o do Ni. De acordo com Mendelev, o número atômico era aproximadamente igual à metade do peso atômico. Moseley definiu o peso atômico como igual ao número de elétrons do átomo eletricamente neutro.
    Comparando-se as expressões obtidas por Moseley com a fórmula de Balmer-Rydberg deduzida por Bohr, vê-se que elas diferem pela presença de uma constante subtrativa ao valor de Z. Moseley explicou-a como sendo devido ao efeito de blindagem da carga nuclear pelos elétrons orbitais mais intensos.
    A lei de Moseley apresentava resultados bastante diferentes daqueles do paradigma científico vigente. Através dela Moseley deduziu que entre o hidrogênio e o urânio, deveria haver exatamente 92 tipos de átomos, cujas propriedades químicas eram governadas por Z, e não pelo peso atômico. Isto significava dizer que a tabela periódica devia seguir a ordem crescente do número atômico e não a do peso atômico. Obedecida essa seqüência, alguns lugares daquela tabela ficaram vagos, os correspondentes a Z = 43, 61, 75, 85 e 87. Por essa época, havia uma grande polêmica entre os químicos a respeito do número exato de terras raras; discutia-se se estas iam de Z=58 a Z=71 ou a Z=72.
    O grande estudioso das terras raras era Georges Urbain, sendo ele inclusive o descobridor de uma delas, o lutécio (Z=71), em 1907. Em 1911, Urbain pensou ter isolado outra terra rara, com Z=72, a que chamou de céltio. No entanto, os métodos químicos de análise até então usados eram complicados e incertos. Ao ouvir falar, em 1914, do método de Moseley, Urbain deslocou-se da França para a Inglaterra, levando amostras de terras raras, inclusive uma do provável céltio. Em poucas horas Moseley as examinou e as classificou sem, no entanto, confirmar o céltio. A amostra deste, observou Moseley, nada mais era do que uma mistura de terras raras conhecidas. Urbain ficou tão impressionado com o trabalho de Moseley que resolveu divulgá-lo na comunidade dos químicos. Apesar dessa postura, Urbain continuou acreditando ser o elemento Z=72 uma terra rara, e prosseguiu em sua busca. Essa crença foi fortemente renovada quando em maio de 1922, Alexandre Dauvillier anunciou ter isolado o céltio, através de uma análise do espectro de raios-X do tipo L de amostras contendo as terras raras ytérbio (Z=70) e lutécio. Essa notícia foi tão fantástica que chegou a impressionar Rutherford, pois desde 1914 ele acompanhava com grande interesse a polêmica sobre ser ou não ser uma terra rara, o elemento 72. Convicto de que essa polêmica havia encerrado, Rutherford escreveu uma carta à Nature (17/06/1922) na qual dizia que um dos lugares vagos da tabela periódica de Moseley acabara de ser preenchido.
    Os físicos dinamarqueses, com base no modelo de Bohr, afirmavam que o elemento 72 devia ser um metal similar ao zircônio. O próprio Bohr fizera esta afirmação em sua sexta "lecture" Wolfskehl, ministrada em Göttingen, no dia 21 de junho de 1922. Ao ler a carta de Rutherford, na Nature do dia 17, Bohr chegou a pensar que sua afirmativa estava errada, tanto que manifestou essa opinião em carta enviada a James Franck em 15 de julho do mesmo ano. No entanto, ao saber que Dirk Coster, um especialista em espectroscopia de raios-X, não concordava com a interpretação de Dauvillier, Bohr resolveu convidá-lo a trabalhar em Copenhague para que, juntamente com von Hevesy, os três pudessem dirimir tão polêmica questão. Coster chegou a Copenhague em setembro, iniciando imediatamente a busca do elemento 72 em minérios de zircônio. No dia 11 de dezembro, poucos minutos antes de proferir sua "Nobel lecture", Bohr recebeu um telefonema de Coster dando conta de resultados positivos. No final da sua "aula Nobel", Bohr anunciou a importante descoberta. No volume 111 de Nature(20/01/1923), em carta assinada por Coster e von Hevesy, o mundo científico fica sabendo da descoberta do háfnio, o elemento com número atômico 72. O nome foi dado em homenagem a Copenhague, que em latim significa hafniae. Segundo Mehra e Rechenberg, essa descoberta constituiu-se no maior triunfo de Niels Bohr.
    Com relação aos elementos previstos por Moseley, é oportuno salientar que o elemento 75, o rénio, foi descoberto em 1925, pelo casal Noddack. O elemento 87, descoberto em 1939, por Marguerite Perey, recebeu o nome de frâncio e pertence a uma família radioativa natural. Os demais elementos (43, 61 e 85) foram obtidos artificialmente. Sendo suas vidas-médias muito curtas, esses elementos não podiam ser naturalmente produzidos, ou pelo menos observados.